segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Mais variações sobre Gil Vicente

Onzeneiro- Pois que triste episódio
Acabei como Adão.

Diabo- Pois, Vossa Excelência
Quereis algo mais que a vida terrena
Quereis lá tornar
Para semear maçãs?

Onzeneiro-Tende piedade de mim
É só o que eu peço
Mais de dez moedas têm eu
Mas não hás-de ficar com elas…
É dinheiro que me custou a ganhar…

Diabo- Vossa Excelência enganou-se no verbo
Não é ganhar
Querias dizer: roubar.

Onzeneiro- Com a infelicidade de outros durmo eu bem
Tiro algum a quem já pouco tem
Aprendi esta arte desde moço
E a ninguém deixo osso.

Diabo- Tenha a bondade de entrar
A bordo e remar
Pois as terras de Lúcifer
O esperam…

Onzeneiro- Às terras do mal, não hei de eu chegar
Nem que para isso
Vinte moedas tenham que entregar

Diabo- Vossa Majestade acha então
Que estou a profanar um tal plano
Subi a bordo e hasteai a vela
Porque hoje é dia de festa.

Onzeneiro-Não hei de eu ir aí
Nem que tenha que subornar
Não vou remar
Chame um marinheiro

Diabo- Oh que gentil recear…


Miguel Mendinhas, 9ºB

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Confissão do Sapateiro



Bem, meu Deus nunca roubei
Nem assassinei
e nem a minha mulher “adulterei”

Renuncio ao baptismo
Em remissão dos pecados
Nunca roubei tudo
Foi só um bocado de cada vez…

Rezei muito a Deus e a Maria
Sabia lá eu que quando morresse
Com nada ficaria
E que as orações não me serviriam?!

Não compreendo:
Não é pagar muito
Um par de sapatos, 80 reis
O preço é baixo
E felizes os demais.

Sempre pensei que muito podia pecar
E depois, era só falar
Com o padre e me confessar
O prior dizia
“Meu filho”, um Pai Nosso e duas Avé Marias vais ter de rezar.

Eu rezava no dia seguinte
Mas já novamente pecava.
Mas que triste fim
Eu vim ter
E na barca do inferno
Vou eu agora embarcar.

Entro agora na barca
Com a corda ao pescoço
Castigo merecido
Para quem tudo come
E nem deixa osso

Tenho falta de juízo
Para a minha idade
É tão verdade.


Miguel Mendinhas, 9ºB